terça-feira, 4 de março de 2014

Luz



"Como eu já tinha comentado, meu primeiro e muito importante contato com a minha nova fase foi a Ana Saraiva. Ela me deu esperança, compaixão, fraternidade, informação, luz e tantas e tantas outras coisas.. ela me mostrou muitas coisas e que agora, eu entendo o porque.. Porque ela é especial! É guerreira, linda e vence todos os dias suas lutas. Vive, Ama e Acredita! Ela me mostra que todas as fases são necessárias e que todas valem a pena!  Segue um pouco da história dela e espero que possa ajudar muitos como me ajudou!" Renata Moraes
                                                                                                       

Olá!

Chamo-me Ana Saraiva, sou de Portugal e tenho 25 anos.

A história entre a Dermatomiosite e eu começou quando tinha 12 anos.

Estava na escola, numa aula de educação física, a correr, quando senti uma dor forte num músculo da perna, parecia que me estavam a espetar agulhas bem fundo. 

Nos dias a seguir, durante uma semana, apareceu-me uma mancha na face, por baixo do olho (gênero de uma picada de mosquito), que começou a inchar muito até tapar o olho. Nessa altura fui há minha pediatra e ela receitou-me uma pomada há base de cortisona que ainda me fez piorar mais. Nos dias seguintes comecei a sentir um estranho cansaço a andar e a fazer o meu dia-a-dia. 

Como não passava e a cada dia estava pior, tanto a nível da pele como do cansaço, (que os meus pais pensavam ser mimo e ser uma desculpa para andar ao colinho) a minha mãe, através de uma antiga amiga e patroa- D. Helena Pedreiro, a quem hoje agradeço imenso pela ajuda que nos deu- levou-me a uma médica (Doutora Ana Moreno) no Hospital da Universidade de Coimbra, há unidade de Dermatologia. Mal me viu, a doutora, desconfiou de dermatomiosite e assim sendo mandou-me fazer exames na manhã do dia seguinte. 

Passou-se tudo muito rápido e tive de ser logo internada no hospital, pois os exames diagnosticaram mesmo a Dermatomiosite. Fiquei lá internada durante 12 dias. Todos os dias fiz exames diferentes… fui como se diz “um ratinho de laboratório”, uma cobaia para os alunos de medicina e para os próprios médicos do hospital, pois tratava-se de uma doença muito rara. Entrei naquele hospital pelo meu próprio pé e sem tomar nenhum medicamento… saí de lá quase sem conseguir andar e a tomar corticoides e outros medicamentos. 

Passados uns meses, como a minha doença não melhorava, a Doutora Ana (excelente dermatologista, ótima pessoa e com um enorme coração), aconselhou-me a ir a uma consulta ao pediátrico de Coimbra com um Reumatologista, o Doutor Manuel Salgado - a quem agradeço muito tudo o que fez por mim, tenho imensa confiança no seu trabalho, é um excelente médico, uma pessoa extraordinária, tem um otimismo que ajuda qualquer doente crônico a superar as maiores dificuldades. Agradeço-lhe a vida que posso fazer hoje! Nesta nova fase o médico optou por iniciar um tratamento há base de hemoglobinas. 

No primeiro ano fiz o tratamento uma vez por mês em que tinha o medicamento a correr no cateter durante 12 horas seguidas. Nos dois dias seguintes não conseguia ir há escola porque ficava muito enjoada e só tinha vontade de vomitar. Ficava com febre e muito mole. Juntamente com este tratamento comecei também a fazer o metotrexato injetável (por ser uma dose muito elevada) uma vez por semana (tive sorte em ter um casal amigo de enfermeiros que foram incansáveis comigo) e continuei com o corticoide e com o folicil. 

No segundo ano já fiz o tratamento de 2 em 2 meses e no terceiro ano fiz só duas vezes de 3 em 3 meses. As melhoras foram excelentes. O medicamento fez mesmo milagres. Eu voltei a andar normalmente, voltei a tomar banho e a vestir-me sozinha, a pentear-me e a levantar-me sozinha do sofá! Coisas que nos 3 primeiros anos da doença deixei de fazer sozinha. 

Uma vez, quando estava sozinha em casa, há hora do lanche quis ir ao frigorífico buscar um lanche… dei um mau jeito, desequilibrei-me e cai no chão… tentei de tudo para me levantar e não consegui. Rastejei até há parede e fiquei lá durante horas até que o meu pai chegou do trabalho e me ajudou a levantar. 

Durante muito tempo, quase todas as almofadas da casa eram minhas, pois só com elas a fazerem altura no sofá é que eu me conseguia levantar sozinha. 

Outra coisa muito difícil de suportar ao longo desses anos foram as erupções cutâneas que me foram aparecendo nas articulações e na face. As que mais me custaram foram as dos cotovelos. Abriram-se feridas horríveis, fundas, que deitavam pus e uma espécie de pedrinhas. Estas feridas formavam uma crosta grossa e rija. Foram dores horríveis, nem as camisolas eu aguentava. O pior de tudo é que nada ajudava a que essas feridas sarassem. 

Os anos seguintes foram diferentes uns dos outros. Entre redução de medicação a aumento, entre sarar feridas e criar outras as coisas foram-se recompondo. Cheguei também a fazer um tratamento de acupuntura que ajudou nas melhoras. 

Quando fiz os 18 anos, atingi a maioridade, tive de deixar as consultas de reumatologia no pediatra e passar para a reumatologia do Hospital da Universidade de Coimbra. O médico reumatologista que me começou a seguir foi o Doutor Luís Inês- excelente médico que me acompanhou numa fase bem diferente, a fase em que já estava mais crescida e em que as preocupações já eram outras. A partir desta idade não houveram grandes recaídas. 

Neste momento estou com 25 anos e faço a minha vida normal. 
Já tirei o meu curso, sou licenciada em Design de Equipamento, já consigo fazer tudo sozinha no meu dia-a-dia. 

Todos estes anos, a cima de tudo, serviram para eu aprender muito…para aprender que somos mais fortes do que o que pensamos, que temos pessoas que nos amam estejamos nos com 10 ou 100 kilos, lindos ou feios, bem dispostos ou mal dispostos, a correr ou numa cadeira de rodas. Só quem passa por estas coisas ou quem vive demasiado perto de nós consegue perceber o quanto custa não podermos pentear o cabelo, ficar em casa enquanto as amigas vão sair para as festas, entre muitas mais coisas banais. 

O que mais me ajudou a suportar estas fases todas foi a fé que a minha mãe me ensinou a ter, a esperança que os meus médicos me deram, o carinho e boa disposição do meu pai, o profissionalismo dos meus 3 médicos, o apoio incondicional dos meus 2 irmãos, a amizade das minhas cunhadas, a alegria contagiante das minhas sobrinhas, o amor e compreensão do meu namorado e a ajuda de todos os meus amigos e familiares mais próximos. 

Aqui falei só um pouco do que foram estes 13 anos de dermatomiosite, pois é impossível descrever todos os pormenores em tão poucas palavras. 
Sem dúvida que estes anos davam um bom livro. 
Como última parte, mas não menos importante, quero falar da “Amiga do Brasil”, a Renata! 
Foi uma ajuda tão boa! Saber que existe alguém que nos entende a 100%, que sabe aquilo por que passamos, que sabe o tamanho da nossa dor mas também o tamanho da nossa alegria quando conseguimos fazer o simples gesto de atar o cabelo… 
Vou guardar as suas mensagens com muito carinho e gratidão! 
Obrigada pela oportunidade que me está a dar de partilhar a minha história juntamente com a sua. Espero ajudar com este testemunho! 

Um grande beijinho